Lua de verão
risca o céu num tom de prata.
E o silêncio é ouro.
Terezinha Manczak
quinta-feira, 18 de novembro de 2010
domingo, 7 de novembro de 2010
Ao Deus dará
Um filete cor de sangue descia do peito até a barra do vestido da moça, a caminho do altar.
Do lado de fora da igreja, alguém apertara o gatilho, no exato momento em que as portas da nave se abriam e ela dava os primeiros passos sobre o tapete vermelho.
O tiro fatal separou noivo e noiva.
Terezinha Manczak
Um filete cor de sangue descia do peito até a barra do vestido da moça, a caminho do altar.
Do lado de fora da igreja, alguém apertara o gatilho, no exato momento em que as portas da nave se abriam e ela dava os primeiros passos sobre o tapete vermelho.
O tiro fatal separou noivo e noiva.
Terezinha Manczak
Travessia
Em poucos minutos, o fogo consumiu toda a matéria humana que cobria aquele corpo cheio de vaidades.
Uma nuvem esbranquiçada de fumaça subiu até o teto, ficando no fundo do forno um tanto de cinzas suficiente para encher uma pequena caixinha de latão.
Agora o ser era como uma ave no ovo.Sem asas e sem canto.Uma ave no mundo ovo.
Presa por uma corrente no fundo da embarcação, uma gaiola de musgos resguardava-o em sua travessia, ainda sem saber exatamente para onde.
O barqueiro, um homem vestido de negro, não remava. Apenas conduzia a barca, deixando o manejo dos remos por conta das criaturas que atravessavam com ele, naquelas águas turbulentas e escuras. Em pé, de braços cruzados, fitava- os com seus olhos de fogo, sem nenhuma expressão.
Nem o vento cortante, ou as ondas que se levantavam respingando em todos os passageiros, conseguia apagar aquelas duas brasas acesas nas cavidades orbitais de seu rosto esquálido.
A ave já emplumada no mundo ovo, aos poucos adquiria um pouco de consciência. Sentia o balanço das remadas, a umidade do ar. O seu casulo de tempos passados, parecia estalar a cada braçada mais forte dos remadores condenados. O espaço que ocupava tornava – se menor, à medida que se aproximavam da margem. Não era dor o que sentia. Mas para respirar de novo, precisava fazer algum esforço. O seu peito ardia e dentro dele algo batia de leve.
Medo. Era medo o que a fazia tremer nas pernas ainda dobradas na posição de feto. Não sabia o que a esperava quando chegasse ao seu destino.
Mas nem tudo era desespero. Do outro lado do rio, talvez logo pudesse reencontrar o pássaro de vôo olímpico, que já havia feito a sua passagem.
Ambos guardavam um segredo: poemas e violetas azuis.
Será preciso que ele pouse novamente em suas mãos, para que o céu e a terra se toquem, e ela ganhe asas também.
Terezinha Manczak
Em poucos minutos, o fogo consumiu toda a matéria humana que cobria aquele corpo cheio de vaidades.
Uma nuvem esbranquiçada de fumaça subiu até o teto, ficando no fundo do forno um tanto de cinzas suficiente para encher uma pequena caixinha de latão.
Agora o ser era como uma ave no ovo.Sem asas e sem canto.Uma ave no mundo ovo.
Presa por uma corrente no fundo da embarcação, uma gaiola de musgos resguardava-o em sua travessia, ainda sem saber exatamente para onde.
O barqueiro, um homem vestido de negro, não remava. Apenas conduzia a barca, deixando o manejo dos remos por conta das criaturas que atravessavam com ele, naquelas águas turbulentas e escuras. Em pé, de braços cruzados, fitava- os com seus olhos de fogo, sem nenhuma expressão.
Nem o vento cortante, ou as ondas que se levantavam respingando em todos os passageiros, conseguia apagar aquelas duas brasas acesas nas cavidades orbitais de seu rosto esquálido.
A ave já emplumada no mundo ovo, aos poucos adquiria um pouco de consciência. Sentia o balanço das remadas, a umidade do ar. O seu casulo de tempos passados, parecia estalar a cada braçada mais forte dos remadores condenados. O espaço que ocupava tornava – se menor, à medida que se aproximavam da margem. Não era dor o que sentia. Mas para respirar de novo, precisava fazer algum esforço. O seu peito ardia e dentro dele algo batia de leve.
Medo. Era medo o que a fazia tremer nas pernas ainda dobradas na posição de feto. Não sabia o que a esperava quando chegasse ao seu destino.
Mas nem tudo era desespero. Do outro lado do rio, talvez logo pudesse reencontrar o pássaro de vôo olímpico, que já havia feito a sua passagem.
Ambos guardavam um segredo: poemas e violetas azuis.
Será preciso que ele pouse novamente em suas mãos, para que o céu e a terra se toquem, e ela ganhe asas também.
Terezinha Manczak
O JARDIM SUSPENSO DOS MORTOS
Meu corpo pesa sobre a fria mesa de uma sala desconhecida e ao mesmo tempo flutua sem esforço e alheio à minha vontade.
Não consigo abrir os olhos, mas percebo movimentos ao meu redor. Sei e nada faço. Silencio, enquanto o grito que contenho sufoca - me ainda mais.
Alguns vultos dançam em minhas retinas enclausuradas, sem formas e sem nomes.
Um homem de branco me conduziu até aqui. Foi a última imagem que guardei após ter ouvido o ruído surdo de uma rajada de metralhadoras. O Carro Forte. O furgão amarelo no estacionamento do Banco.
Não ouço vozes. Apenas um som longínquo que lembra o vento ou pios de pequenas aves. Algo como cânticos, música suave ou sussurro de crianças.
Sempre pensei que ficaria furiosa e revoltada ao saber - me morta. Mas o que sinto agora, ou o que não sinto, é calmo e inesperado
Queria mais tempo na Terra. Uma vida que acaba assim , como um cristal que se quebra, ao meio dia de uma terça-feira de sol e de tantas coisas por fazer.
Deixei o jardim sem poda, a roupa por pendurar, as contas sem pagamento. O conto pela metade e as visitas ao meu pai, mais uma vez adiada.
Sei que mandarão roçar o gramado; as dívidas, o seguro cobre.O conto, será retirado da máquina de escrever e jogado no lixo. Não fará falta alguma. Era só um conto. Só um faz de contas. As roupas, centenas de vezes mais serão batidas, centrifugadas e penduradas nos varais. O pai, dói não tê-lo poupado disso.
Enterrar. Essa palavra , sim, me apavora. O escuro. O vazio. Os vermes.
Prefiro o fogo. A cremação do corpo. As labaredas consumindo meus ossos e minha carne ainda jovem, tão quente e macia.
No crematório, imagino uma cena de puro ilusionismo. O caixão que desliza por baixo de uma cortina e que desaparece.
Um corpo em chamas. Um clarão. Um punhado de cinzas e um pouco de memória.
Terezinha Manczak
Meu corpo pesa sobre a fria mesa de uma sala desconhecida e ao mesmo tempo flutua sem esforço e alheio à minha vontade.
Não consigo abrir os olhos, mas percebo movimentos ao meu redor. Sei e nada faço. Silencio, enquanto o grito que contenho sufoca - me ainda mais.
Alguns vultos dançam em minhas retinas enclausuradas, sem formas e sem nomes.
Um homem de branco me conduziu até aqui. Foi a última imagem que guardei após ter ouvido o ruído surdo de uma rajada de metralhadoras. O Carro Forte. O furgão amarelo no estacionamento do Banco.
Não ouço vozes. Apenas um som longínquo que lembra o vento ou pios de pequenas aves. Algo como cânticos, música suave ou sussurro de crianças.
Sempre pensei que ficaria furiosa e revoltada ao saber - me morta. Mas o que sinto agora, ou o que não sinto, é calmo e inesperado
Queria mais tempo na Terra. Uma vida que acaba assim , como um cristal que se quebra, ao meio dia de uma terça-feira de sol e de tantas coisas por fazer.
Deixei o jardim sem poda, a roupa por pendurar, as contas sem pagamento. O conto pela metade e as visitas ao meu pai, mais uma vez adiada.
Sei que mandarão roçar o gramado; as dívidas, o seguro cobre.O conto, será retirado da máquina de escrever e jogado no lixo. Não fará falta alguma. Era só um conto. Só um faz de contas. As roupas, centenas de vezes mais serão batidas, centrifugadas e penduradas nos varais. O pai, dói não tê-lo poupado disso.
Enterrar. Essa palavra , sim, me apavora. O escuro. O vazio. Os vermes.
Prefiro o fogo. A cremação do corpo. As labaredas consumindo meus ossos e minha carne ainda jovem, tão quente e macia.
No crematório, imagino uma cena de puro ilusionismo. O caixão que desliza por baixo de uma cortina e que desaparece.
Um corpo em chamas. Um clarão. Um punhado de cinzas e um pouco de memória.
Terezinha Manczak
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